Compras Compulsivas e TDAH: Como a Busca por Dopamina Pode Sabotar Seu Bem-Estar e Como Reverter Esse Ciclo

Compras CompulsivasCompras Compulsivas e TDAH: Como a Busca por Dopamina Pode Sabotar Seu Bem-Estar e Como Reverter Esse Ciclo

Compras compulsivas são um comportamento caracterizado pela aquisição recorrente e descontrolada de bens, muitas vezes motivada por impulsos emocionais e não por necessidades reais. Esse fenômeno está intimamente relacionado a questões de saúde mental, sendo frequentemente associado a transtornos de humor, ansiedade e, especialmente, ao Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH). Uma das principais explicações para esse vínculo está na forma como o cérebro de pessoas com TDAH processa a dopamina, um neurotransmissor essencial para a regulação do prazer, da recompensa e do controle de impulsos.

A Relação entre TDAH e Dopamina

O TDAH é um transtorno neurobiológico que afeta a capacidade do indivíduo de manter o foco, controlar impulsos e organizar suas atividades. Isso ocorre devido a disfunções nos circuitos cerebrais que utilizam dopamina, particularmente nas áreas do cérebro responsáveis pela tomada de decisões e pelo planejamento a longo prazo. A dopamina desempenha um papel vital na motivação e na busca por recompensas, regulando os níveis de prazer e satisfação obtidos em diversas atividades.

Em pessoas com TDAH, os níveis de dopamina tendem a ser mais baixos do que o normal, o que pode levar a uma busca constante por estímulos que aumentem temporariamente essa substância no cérebro. Atividades que liberam dopamina de forma rápida e intensa, como compras, podem se tornar um mecanismo de compensação. A compra compulsiva, nesse contexto, atua como uma tentativa de buscar uma gratificação imediata para aliviar a sensação de desconforto emocional ou a frustração gerada pela falta de dopamina. Esse ciclo vicioso faz com que as compras se tornem uma forma rápida de obter prazer, mas os efeitos são temporários e levam à necessidade de repetição constante.

O Papel da Gratificação Instantânea

Uma característica comum do TDAH é a dificuldade em lidar com gratificações adiadas, ou seja, em aguardar pacientemente por uma recompensa a longo prazo. Em vez disso, as pessoas com o transtorno tendem a preferir recompensas imediatas, mesmo que estas sejam de menor valor. A gratificação instantânea, proporcionada pelas compras, se torna irresistível, pois oferece uma descarga imediata de dopamina, criando a sensação temporária de alívio e satisfação. Contudo, esse alívio é de curta duração, e o indivíduo frequentemente se vê em uma espiral de gastos e arrependimentos, com consequências financeiras e emocionais.

O ato de comprar, nesses casos, não está relacionado a uma necessidade genuína, mas à busca por uma sensação de controle, prazer ou escape de situações emocionais desagradáveis. Quando a compra é realizada, há uma liberação inicial de dopamina, que logo é seguida por sentimentos de culpa, arrependimento ou frustração. Para amenizar esses sentimentos, o ciclo se repete, levando à perpetuação do comportamento compulsivo.

Dopamina e o Ciclo de Recompensa

O ciclo de recompensas do cérebro é central para a compreensão do comportamento compulsivo em pessoas com TDAH. Em situações normais, a dopamina é liberada de maneira equilibrada quando uma tarefa é realizada com sucesso ou uma meta é alcançada. Entretanto, no cérebro de uma pessoa com TDAH, a dopamina é liberada de forma irregular. Por isso, atividades que oferecem uma recompensa imediata, como compras, videogames ou até comer compulsivamente, acabam se tornando mecanismos de sobrevivência emocional para manter os níveis de dopamina adequados, ainda que temporariamente.

Esse ciclo de recompensa imediato é agravado por fatores emocionais, como baixa autoestima, ansiedade e sensação de incapacidade. O prazer obtido pela compra, no entanto, logo dá lugar à culpa e ao arrependimento, uma vez que o impulso inicial não resolve as questões emocionais subjacentes. Assim, a pessoa entra em um ciclo vicioso: compra para aliviar a frustração, sente-se culpada, tenta compensar esse sentimento comprando mais, e assim por diante.

Impactos na Qualidade de Vida

As consequências das compras compulsivas vão além do impacto financeiro. Esse comportamento pode prejudicar as relações interpessoais, aumentar os níveis de estresse e contribuir para o desenvolvimento de outros transtornos, como depressão e ansiedade. Pessoas com TDAH já enfrentam dificuldades em manter uma rotina organizada e estável, e o comportamento compulsivo de compras agrava ainda mais esses desafios.

Além disso, a compra compulsiva pode se tornar uma forma de automedicação emocional. O alívio temporário proporcionado pela compra mascara problemas mais profundos, como a dificuldade de lidar com frustrações, a baixa tolerância ao tédio ou à espera e a busca constante por novos estímulos. Em última análise, a compulsão por compras se torna um sintoma de um quadro mais amplo, relacionado à gestão das emoções e à regulação dos impulsos.

Psicoterapia e Medicação no Tratamento

Dado que o comportamento de compras compulsivas em pessoas com TDAH está intimamente relacionado ao desequilíbrio nos níveis de dopamina e à busca por gratificação imediata, é fundamental que o tratamento aborde tanto os aspectos biológicos quanto emocionais dessa condição.

A psicoterapia, em particular a terapia cognitivo-comportamental (TCC), tem se mostrado altamente eficaz no tratamento de compras compulsivas. A TCC ajuda o indivíduo a identificar os padrões de pensamento e comportamento que levam ao impulso de comprar e oferece estratégias para modificar esses padrões. Técnicas como o controle de estímulos, a reestruturação cognitiva e o treinamento de habilidades de resolução de problemas podem auxiliar na redução do comportamento compulsivo.

Além da psicoterapia, a medicação pode ser necessária para tratar os desequilíbrios neuroquímicos subjacentes ao TDAH. Medicamentos que aumentam a disponibilidade de dopamina no cérebro, como estimulantes (metilfenidato e anfetaminas), podem ajudar a melhorar o controle dos impulsos e a reduzir a necessidade de buscar gratificação imediata por meio de comportamentos prejudiciais, como as compras compulsivas.

Flexibilizando a Busca por Gratificações Saudáveis

O tratamento eficaz deve incluir a construção de novas formas de buscar gratificação de maneira saudável e sustentável. Isso pode envolver o desenvolvimento de atividades prazerosas que também promovam o bem-estar mental e emocional, como o exercício físico, hobbies criativos, ou a prática de mindfulness. Além disso, a criação de uma rotina estruturada, com metas e recompensas a longo prazo, ajuda o indivíduo a aprender a lidar melhor com a espera por gratificações, reduzindo a necessidade de buscar alívio imediato por meio de compras.

Em suma, o comportamento de compras compulsivas em pessoas com TDAH é uma manifestação de um desequilíbrio neuroquímico e emocional que pode ser tratado com sucesso por meio de uma abordagem integrada que combine medicação, psicoterapia e o desenvolvimento de estratégias de autorregulação. A chave para o controle desse impulso está na flexibilização da busca por gratificações e na construção de uma relação mais saudável com o prazer e o consumo.

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Marcelo Comparin – Psicólogo em Campo Grande MS.

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